1.
Introdução
O presente trabalho se destina a explicar as fontes do direito adotadas
pelo ordenamento jurídico brasileiro e interpretar a sua aplicação às
circunstâncias em que há ausência de norma para o caso concreto.
Tal temática é imprescindível à iniciação científica do acadêmico na
área de conhecimentos jurídicos, compreendendo a etapa preliminar para o estudo
do Direito. Interpretar as fontes do direito não é somente conhecer a hipótese de
sua aplicação na falta de norma para o caso concreto; é, na verdade, garantir a
solução dos conflitos, ainda que não exista lei específica para o caso,
impedindo a pendência de processos por falta de decisão judicial.
2.
Fontes do Direito
A palavra “fonte” possui vários significados. Pode ser entendida como
uma nascente de água, como um texto original de uma obra, um princípio, a
origem de algo ou causa de onde provem efeitos físicos ou morais.
MACHADO assim conceitua a fonte do direito:
A fonte de uma coisa é o lugar de onde surge essa coisa. O lugar de onde
ela nasce. Assim, a fonte do Direito é aquilo que o produz, é algo de onde
nasce o Direito. Para que se possa dizer o que é fonte do Direito é necessário
que se saiba de qual direito. Se cogitarmos do direito natural, devemos admitir
que sua fonte é a natureza humana. Aliás, vale dizer, é a fonte primeira do
Direito sob vários aspectos.1
Conforme o exposto acima, fonte constitui o lugar de onde surge o
direito, ou seja, sempre que se tratar de fonte do direito deve-se entender o
seu ponto de partida, o seu início. Se num determinado povo, por exemplo, as
pessoas costumam fazer algo que venha a culminar numa lei, a sua fonte é
entendida como o costume daquele determinado povo, pois o diferencia dos outros
povos e, sem esse costume, essa lei não surgiria.
DEL VECCHIO assevera:
Fonte de direito in genere é a natureza humana, ou seja, o espírito que
reluz na consciência individual, tornando-se capaz de compreender a
personalidade alheia, graças à própria. Desta fonte se deduzem os princípios
imutáveis da justiça e do Direito Natural.2
Assim, pode-se entender que os princípios e valores morais que atingem
um dado povo é fonte do direito, partindo da consciência individual de cada
pessoa, sendo que cada povo possui a sua cultura e seus costumes.
As fontes do direito estão previstas no artigo 4.º da Lei de Introdução
ao Código Civil que estabelece: "Quando a lei for omissa, o juiz decidirá
o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito".
Assim, o intérprete é obrigado a integrar o sistema jurídico, ou seja, diante
da lacuna (a ausência de norma para o caso concreto), ele deve sempre encontrar
uma solução adequada. Basta analisar o verbo “decidirá” para entender que o
sistema jurídico ordena a decisão do caso concreto.
O artigo já mencionado estabelece uma hierarquia entre as fontes, pois
só autoriza o juiz a valer-se de outras fontes quando houver omissão na lei e
impossibilidade de aplicação da analogia, buscando resoluções legais para casos
semelhantes. Assim, a lei é uma fonte principal, sendo fontes secundárias a
analogia, os costumes, os princípios gerais do direito, a doutrina e a
jurisprudência.
2.1.
Lei
A lei é o preceito jurídico escrito, emanado do legislador e dotado de
caráter geral e obrigatório. É, portanto, toda norma geral de conduta, que
disciplina as relações de fato incidentes no Direito, cuja observância é
imposta pelo poder estatal. Segundo Del VECCHIO, lei “é o pensamento jurídico
deliberado e consciente, formulado por órgãos especiais, que representam a
vontade predominante numa sociedade.”3 Assim, a lei constitui a
vontade do povo, sendo elaborada por legisladores eleitos pelo mesmo, como
ocorre no Brasil.
A lei tem por objetivo resolver o problema da antinomia, ou seja, o
problema do conflito e da contradição das normas, hipótese em que mais de uma
norma incide sobre o caso concreto. Mas, quanto à aplicação da lei, devem
seguir uma hierarquia, sendo a Constituição Federal a lei maior, as leis
complementares e ordinárias abaixo e da Constituição Federal e os decretos,
portarias e demais atos administrativos por último. Sendo assim, as leis de
menor grau devem obedecer às de maior grau.
2.2.
Analogia
Analogia é fonte formal mediata do direito, utilizada com a finalidade
de integração da lei, ou seja, a aplicação de dispositivos legais relativos a
casos análogos, ante a ausência de normas que regulem o caso concretamente
apresentado à apreciação jurisdicional, a que se denomina anomia.
2.3.
Costumes
O costume no direito é considerado uma norma aceita como obrigatória
pela consciência do povo, sem que o Poder Público a tenha estabelecido. Segundo
RIZZATTO, “o costume jurídico é norma jurídica obrigatória, imposta ao setor da
realidade que regula, possível de imposição pela autoridade pública e em
especial pelo poder judiciário.”4 Nesse sentido, os costumes de
um dado povo é fonte do direito, pois pode ser aplicado pelo poder judiciário,
uma vez que o próprio costume constitui uma imposição da sociedade.
O direito costumeiro possui dois requisitos: subjetivo e objetivo. O
primeiro corresponde ao “opinio necessitatis”, a crença na
obrigatoriedade, isto é, a crença que, em caso de descumprimento, incide
sanção. O segundo corresponde à “diuturnidade”, isto é, a simples
constância do ato.
2.4.
Doutrina
Doutrina é o conjunto de indagações, pesquisas e pareceres dos
cientistas do Direito. Há incidência da doutrina em matérias não codificadas,
como no Direito Administrativo e em matérias de Direito estrangeiro, não previstas
na legislação pátria. POMPÉRIO compreende a doutrina como “o acervo de soluções
trazidas pelos trabalhos dos juristas.”5 Nesse sentido, a
doutrina é considerada como fonte por sua contribuição para a aplicação e
também preparação à evolução do direito.
2.5.
Jurisprudência
A jurisprudência é uma função atípica da jurisdição, considerada também
como uma fonte do direito. MACHADO assim explica a jurisprudência:
A palavra jurisprudência pode ser empregada em sentido amplo,
significando a decisão ou o conjunto de decisões judiciais, e em sentido
estrito, significando o entendimento ou diretiva resultante de decisões
reiteradas dos tribunais sobre um determinado assunto.6
De acordo com o exposto, jurisprudência são decisões reiteradas,
constantes e pacíficas do Poder Judiciário sobre determinada matéria num
determinado sentido.
A jurisprudência não precisa ser sumulada para ser fonte. Não pode ser
confundida com a orientação jurisprudencial, que é qualquer decisão do Poder
Judiciário que esclareça a norma legal. A orientação jurisprudencial é apenas
um método de interpretação da lei e não precisa de uniformidade. Em razão
disso, é rara a adoção da jurisprudência como fonte.
2.6.
Princípios gerais do direito
Princípios do direito são postulados que se encontram implícita ou
explicitamente no sistema jurídico, contendo um conjunto de regras.
DINIZ assim explica os princípios gerais do direito:
Quando a analogia e o costume falham no preenchimento da lacuna, o
magistrado supre a deficiência da ordem jurídica, adotando princípios gerais do
direito, que, às vezes, são cânones que não foram ditados, explicitamente, pelo
elaborador da norma, mas que estão contidos de forma imanente no ordenamento
jurídico.7
Entende-se, então, que os princípios gerais de direito são a última salvaguarda
do intérprete, pois este precisa se socorrer deles para integrar o fato ao
sistema.
3.
Ausência de norma
Sempre que houver lacuna, o magistrado deve valer-se das fontes do
direito para a solução do processo, mas é importante entender como ocorre a
verificação da lacuna. Assim, DINIZ expõe:
A constatação da lacuna resulta de um juízo de apreciação, porém o ponto
decisivo não é a concepção que o magistrado tem da norma de direito, nem
tampouco sua Weltanschauung do conteúdo objetivo da ordem jurídica, mas o
processo metodológico por ele empregado.8
Portanto, o processo metodológico empregado pelo magistrado se faz
decisivo para a constatação da lacuna, ou seja, ao apreciar o caso à aplicação
da norma, o magistrado desempenha o processo de análise e interpretação que
resulta na concepção da lacuna, sendo esse processo o ponto decisivo, pois é a
partir dele que o magistrado identifica a ausência de norma.
Diante de hipótese de anomia9, o ordenamento jurídico de um
Estado adotar um entre três sistemas conhecidos para solução da ausência de
norma para o caso concreto, a saber: “non liquet” o sistema pelo qual o
magistrado decide pela não-solução da relação jurídica, por não haver respaldo
legal. Esse sistema é criticado por não atender aos fins primordiais da
jurisdição (realização da justiça, pacificação social e resolução da lide);
“suspensivo” o intérprete suspende o andamento do feito e, consequentemente,
suspende a decisão para a relação jurídica, comunicando o legislativo da
ausência de norma regulamentadora, para fins de edição; e “integrativo”, sendo
o sistema pelo qual, ante a ausência de lei aplicável à relação jurídica sob
decisão, o intérprete não pode se furtar à sentença, devendo fazer uso da
analogia, dos costumes e dos princípios gerais de Direito.
O sistema integrativo mencionado é o adotado pelo ordenamento jurídico
brasileiro, previsto no art. 4º da lei de introdução ao código civil.10
4.
Considerações finais
A principal reflexão a ser feita ao final deste trabalho, é a ciência da
utilização das fontes do direito como preenchimento de lacunas para a adequada
solução do caso concreto. A análise da norma à aplicação ao caso concreto gera,
para o intérprete, um processo metodológico que lhe permite encontrar lacunas
e, consequentemente, supri-las. Assim, o uso das fontes do direito constitui a
garantia da solução do processo, ainda que a lei seja omissa, evitando a
suspensão por respaldo legal.
Nestes termos, é dada a importância ao estudo das fontes do direito,
porque, como exposto no correr do texto, contribui ao intérprete à solução do
processo com o suprimento das lacunas encontradas a partir da análise e
interpretação da norma para o caso concreto.
5. Anomia: ausência de normas
regulamentadoras para um caso concreto.
6. Art. 4º: Quando a lei for omissa,
o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios
gerais de direito.
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